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Payada
Raízes, tronco, ramagem...Ramagem, tronco,
raiz...
Abriu-se uma cicatriz de onde brotei na paisagem...
O tempo me fez mensagem que os ventos pampas dirigem,
Dos anseios que me afligem de transplantar horizontes,
Buscando o rumor das fontes pra beber água na origem.
Sobre o lombo da distância, de paragem em
paragem,
Fui repontando a mensagem de bárbara ressonância,
Fazendo pátria na infância porque precisei fazê-la,
E a Liberdade, sinuela, sempre foi a estrela guia
Que o meu olhar perseguia como quem busca uma estrela.
Pensei chegar alcançá-la, no estágio de índio
rude,
Mas nunca na plenitude, porque essa deusa baguala
Que aos andejos embuçala, nunca ninguém alcançou,
Bisneto nem bisavô, nos entreveros mais brutos,
Labareda de minutos que o vento sempre apagou.
Primeiro era o campo aberto, descampado,
sem divisas...
Com fronteiras imprecisas, mundo sem longe nem perto..
Eu era o índio liberto, barbaresco e peleador
Rei de mim mesmo, senhor da natureza selvagem,
A religião da coragem e o sol de bronze na cor
Um dia veio o jesuíta a este rincão do
planeta
Vestindo a sotaina preta na catequese bendita
Foi mais do que uma visita à minha pampa morena
Bombeei por trás da melena, olhos nos olhos o irmão,
E gravei no coração a santa cruz de Lorena!
Mais tarde veio mais gente às minhas
terras campeiras...
A falange das bandeiras, impiedosa e inclemente...
Me levantei de repente e as tribos se levantaram...
As várzeas se ensangüentaram, elas que eram verdejantes,
Mas eu venci os bandeirantes, que nunca mais retornaram!
E depois vieram os lusos, os negros, os castelhanos,
E nos pagos campejanos, novas normas, novos usos...
As violências e os abusos da Ibéria, Castela e Lácio
Que rasgaram o prefácio e mataram as plegárias
E as ânsias comunitárias dos irmãos de Santo Inácio.
Não pude deter a vaga de Andonega e Barbacena...
Se a História não os condena, a mancha nunca se apaga!
A opressão jamais indaga na sua ambição mesquinha,
Era meu tudo o que tinha, era meu tudo o que havia,
E eu morri porque dizia que aquela terra era minha!
Mas o eterno não morre, porque permaneço
vivo...
No lampejo primitivo de cada fato que ocorre
O meu sangue rubro corre na velha raça gaudéria,
Corcoveando em cada artéria pela miscigenação
Na bárbara transfusão com os andarengos da Ibéria...
Fui sempre aquilo que sou, sou sempre aquilo que fui,
Porque a vida não dilui o que a mãe terra gerou...
Sou o brasedo que ficou e aceso permaneceu,
Sou o gaúcho que cresceu junto aos fortins de combate
E já estava tomando mate quando a pátria amanheceu!!!
E assim, crescendo ao relento, criado longe
do pai,
Junto ao mar doce - o Uruguai -, o rio do meu nascimento,
Soldado sem regimento no quartel da imensidade...
Um dia me meu vontade, deixei crescer toda a crina
E me amasiei com uma china que chamei de Liberdade!
Por mais de trezentos anos fui pastor e sentinela
Na linha verde e amarela, peleando com castelhanos,
Gravando com "los hermanos" a epopéia do fronteiro!
Poeta, cantor e guerreiro da América que nascia
Na bendita teimosia de continuar brasileiro!!!!
Com Bento em mil entreveros, em barbarescos
ensaios...
Depois contra os paraguaios, em Humaitá e Toneleros
Andei em Monte Caseros, Paisandu, Peribebuí
Passo da Pátria, Avaí... longe do meu território...
E fui ordenança de Osório nos campos de Tuiuti
Depois, em Noventa e três, na gesta federalista,
A pátria a perder de vista, andei peleando outra vez...
Sem soldo no fim do mês porque pelear era lindo,
As espadas retinindo, chapéu batido na copa,
Como carneador de tropa nas forças de Gomercindo
Mais adiante, em Vinte e três, em Vinte e
quatro de novo...
É o destino do meu povo que assim altivo se fez,
A marca da intrepidez deste velho território!
Ante o bárbaro ostensório dos lenços rubros e brancos
Acompanhei os arrancos do velho Flores, e Honório...
Chimangos e maragatos, farrapos, federalistas
Caminhadas e conquistas que a história guarda em seus fatos
Os tauras intemeratos de adaga e pistola à cinta...
Não há ninguém que desminta nossa estirpe de raiz
Que se adonou da matriz nas arrancadas de Trinta
Depois vesti a verde-oliva, como sempre
voluntário,
No "cuerpo" expedicionário, formando uma comitiva
Da nossa indiada nativa pra responder um libelo
E o pendão verde-amarelo, no outro lado do mundo,
Cravei, bem firme e bem fundo, no velho Monte Castelo!
Hoje, tempo de mudar, meu coração continua
O mesmo tigre charrua das andanças do passado.
Sempre de pingo ensilhado, bombeando pampa e coxilha...
A pátria é minha família! Não há Brasil sem Rio Grande
E nem tirano que mande na alma de um Farroupilha!
Δ
Natal
galponeiro
A cuia do chimarrão,
É o cálice do ritual,
E o galpão é a Catedral
Maior da terra pampeana,
Que de luzes se engalana,
Para esperar o NATAL.
A cuia aquece na palma
Da mão da indiada campeira,
Dentro da sua maneira,
Rezando e chairando a alma,
Para recuperar a calma,
Que fugiu do mundo inteiro.
Enquanto o estrelão viajeiro,
Já vem rasgando caminho,
para anunciar o "Piazinho",
A Virgem e o Carpinteiro.
Em nome do Pai,
- Do Filho e do Espírito Santo,
É o chimarrão que levanto,
E o vento faz estribilho,
A prece do andarilho,
Ao Piazito Salvador,
Filho de Nosso Senhor,
Do Espírito e do Pai,
De volta a terra aonde vai,
Falar de novo em amor!
Tem sido assim - dois mil anos,
Ninguém sabe - mais ou menos,
Vem conviver com os pequenos,
De todos os meridianos,
E repetir aos humanos,
As preces de bem querer.
Quem sabe até - pode ser,
Que um dia seja atendido,
E o mundo velho perdido,
Encontre paz para viver.
Ele sabe da apertura,
Em que vive o pobrerio,
A fome - a miséria - o frio,
Porque passa a criatura,
Mas que - inda restam - ternura,
Amizade e esperança,
É que pode, a cada andança,
Mesmo nos ranchos sem pão,
Aliviar o coração,
Num sorriso de criança!
Pra mim - que ouvi na missões,
Causos de campo e rodeio,
Do "Negro do Pastoreio",
Cruzando pelos rincões,
Das lendas de assombrações,
E cobras queimando luz.
Foste - Menino Jesus,
O meu sinuelo de fé,
Juntando ao índio Sepé,
O Nazareno da Cruz!
E a Santa Virgem Maria,
Madrinha dos que não tem,
Fez parte - sempre - também,
Da minha filosofia,
Eu que fiz de Sacristia,
Os ranchos de chão batido,
E que hoje - encanecido,
Sou sempre o mesmo guri,
A bendizer por aí,
O pago que fui parido!
E o Nazareno que vem,
Das bandas de Nazaré,
Chasque divino da fé,
Rastreando a luz de Belém,
Ele que vai morrer também,
Pra cumprir as profecias.
É Natal - nasce o MESSIAS,
Salve o Menino Jesus!
Mas o que fogem da luz,
O matam todos os dias.
Presentes - "Papais Noéis",
Um ano esperando um dia,
Quando a grande maioria,
Sofre destinos cruéis.
O amor pesado a "mil-réis",
E mortos vivos que andam,
Instituições que desandam,
Porque esqueceram JESUS,
O que precisa, é mais luz,
No coração dos que mandam!
Que os anjos digam amém,
Para completar a prece,
Do gaúcho que conhece,
As manhas que o tigre tem.
Não jogo nenhum vintém,
Mesmo sendo carpeteiro,
Mas rezo um Te-Déum campeiro,
Nessa Catedral selvagem,
Pra que faça Boa Viagem,
O enteado do Carpinteiro!
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